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Desinibição Social e Sexual


Algumas pessoas com demência podem perder a inibição e comportar-se de forma socialmente ou sexualmente desadequada. Isso acontece quando a pessoa não é capaz de controlar as suas respostas imediatas a uma situação, ou quando não é capaz de perceber e avaliar as regras sociais ou dar respostas adequadas às pistas sociais do dia-a-dia. 

As pistas sociais são o que indica como nos devemos comportar nas várias situações da nossa vida, como por exemplo, não nos rirmos num funeral ou quando alguém expressa tristeza. 

Uma pessoa com desinibição apresenta: 

  • Falta de tato e de sensibilidade a normas, expetativas e/ou regras sociais; 
  • Perda de noção relativamente ao seu comportamento e aos efeitos que tem nos outros; 
  • Consciência reduzida de si própria e do ambiente em que se encontra; 
  • Impulsividade e perda de controlo; 
  • Fraca perceção do risco e pobre higiene e cuidados pessoais devido às alterações da capacidade de avaliação e discernimento. 

Alguns exemplos de comportamentos sociais desadequados frequentes são: 

  • Exigir atenção; 
  • Usar linguagem desadequada ou ofensiva; 
  • Falar sobre assuntos privados em público; 
  • Comentar os outros que estão à sua volta em voz alta (por exemplo, que alguém tem excesso de peso); 
  • Falar com estranhos como se os conhecessem, fazendo perguntas estranhas ou demasiado pessoais; 
  • Retirar objetos de outras pessoas; 
  • Encontrar humor onde mais ninguém encontra; 
  • Comer de forma impulsiva e descontrolada, incluindo comer do prato das outras pessoas; 
  • Gastar muito dinheiro; 
  • Passar à frente em filas; 
  • Conduzir de forma agressiva. 

Alguns exemplos de comportamentos sexuais desadequados frequentes são: 

  • Dar as mãos, beijar, acariciar ou tocar noutras pessoas contra a sua vontade; 
  • Despir-se em público ou retirar peças de roupa de outras pessoas; 
  • Fazer comentários de natureza sexual ou insinuar-se; 
  • Fazer pedidos sexuais pouco razoáveis e/ou insistentes, aos parceiros ou a estranhos; 
  • Acariciar a zona genital; 
  • Exibicionismo, masturbação ou atos sexuais em espaços públicos. 


A desinibição e os comportamentos desadequados são um dos fatores mais desgastantes para os cuidadores das pessoas com demência, provocando-lhes vergonha ou mal-estar e, muitas vezes, sobrecarga acrescida por ser difícil ou impossível explicar à pessoa porque não deve comportar-se de determinada maneira, já que ela não o conseguirá perceber (devido às alterações da capacidade de julgamento). 

Estes comportamentos são particularmente perturbadores quando existem comentários ou atos de natureza sexual, ou quando uma pessoa que sempre foi reservada e sensível, se passa a comportar de forma rude, insensível ou mesmo ofensiva. 


O que provoca? 

  • Tipo de demência e área do cérebro afetada.  Pessoas com Demência Fronto-Temporal, com a variante frontal da Doença de Alzheimer, ou com outra demência que esteja a afetar mais a área frontal do cérebro - responsável pela capacidade de inibirmos e regularmos o nosso comportamento - são mais prováveis de ter comportamentos desinibidos e desadequados;
  • Necessidades físicas. A pessoa pode precisar de usar a casa-de-banho e, devido às dificuldades existentes não conseguir expressá-lo, começando, por exemplo, a tocar na zona genital. Uma infeção urinária ou genital pode também fazer com que a pessoa toque nessa área. Outro motivo frequente é a pessoa sentir demasiado calor ou a roupa apertada ou desconfortável e, por isso, começar a despir-se em público; 
  • Confusão e desorientação. Devido às dificuldades existentes, a pessoa pode insinuar-se sexualmente a um estranho achando que se trata do seu parceiro, ou ter dificuldades em identificar locais e objetos e começar a urinar num objeto que pensa ser uma sanita ou urinol, ou num local que acha ser a casa-de-banho. Pode também não compreender que não se está a masturbar num local privado; 
  • Falta de estimulação. O aborrecimento e a falta de ocupação e de contacto social pode também favorecer que a pessoa tenha comportamentos desadequados, na tentativa (não consciente) de se entreter, comunicar e se relacionar com outra pessoa.


O que fazer quando a pessoa se comporta de forma desinibida ou desadequada? 

  • Reagir com paciência e gentileza. Tentar recordar que a pessoa não está a agir de forma desadequada de propósito, mas sim devido à demência. Como tal, tentar não interpretar os seus comportamentos como dirigidos a nós e evitar qualquer reação exagerada que possa induzir vergonha, humilhação ou agressividade na pessoa; 
  • Pensar se o comportamento é de facto um problema. É natural para um cuidador ficar preocupado ou envergonhado se a pessoa com demência de quem cuida se estiver a comportar de forma desadequada, em casa ou na rua. No entanto, apesar de desadequados ou estranhos, alguns comportamentos podem não ser problemáticos, pelo que nesses casos o melhor talvez seja não intervirmos, o que evitará conflito e desgaste potencialmente desnecessário. Por exemplo, nalgumas situações falar com estranhos pode não ser um problema: a pessoa pode estar a ir ao encontro da necessidade de socializar e a pessoa desconhecida pode até estar a apreciar a conversa; 
  • Identificar os estímulos que desencadeiam certos comportamentos. Se conseguirmos perceber os gatilhos, frustrações e situações que causam o comportamento, poderemos ser capazes de minimizá-los ou evitar que aconteçam. Por exemplo, se a pessoa com demência se comporta de uma forma sexualmente desadequada quando a ajudamos a mudar de roupa, é possível que ela esteja a interpretar erradamente as nossas ações (como um convite sexual). Nesse caso, devemos tentar alterar a forma como abordamos essa tarefa e perceber se isso faz com que o comportamento não aconteça, ou aconteça com menor frequência. Outro exemplo é perceber se existem ambientes em que determinado comportamento acontece mais regularmente, como locais públicos cheios de pessoas ou com muito movimento, e evitar esses ambientes ou, caso não seja possível evitá-los, planear cuidadosamente essas saídas; 
  • Falar num tom firme mas gentil, quando um comportamento específico é inaceitável. Se a pessoa estiver a ser muito disruptiva ou a fazer com que nós, ou outras pessoas, fiquem desconfortáveis, uma estratégia útil será fazer contacto visual com a pessoa e dizer, num tom de voz firme mas calmo, para parar com o comportamento, e de seguida distraí-la com outro estímulo ou atividade; 
  • Distrair a pessoa com outro estímulo ou atividade. Se a pessoa se estiver a comportar de forma muito rude ou grosseira, não devemos discutir com ela nem corrigir o seu comportamento. Em vez disso, tentar distraí-la subtilmente com outros estímulos, tal como um aperitivo, vídeos ou fotografias no telemóvel, revistas ou objetos para a pessoa mexer. Por exemplo, podemos dizer “segura nisto, por favor” (colocando um objeto na sua mão), “ajuda-me com isto” (a dobrar roupa, a organizar revistas, a encontrar algo), ou “vamos comer qualquer coisa/ouvir música/ver televisão”
  • Desenvolver um plano de ação caso o comportamento ocorra. Pensar antecipadamente no que dizer e fazer se determinado comportamento desadequado acontecer em casa ou na rua, para intervir prontamente e atenuar a situação o melhor possível. Por exemplo, baseado na experiência passada, o que dizer à pessoa com demência para a acalmar e distrair, e o que dizer às outras pessoas (estranhos ou familiares) para as tranquilizar e para que compreendam o que se passa (que a pessoa tem uma doença que a leva a comportar-se desse modo); 
  • Explicar às outras pessoas que a pessoa tem uma doença. Em público, poderá ser pertinente pedir desculpa pelo comportamento desadequado da pessoa com demência, explicando-lhes que não é propositado e que se deve a uma doença. As pessoas poderão tornar-se mais compreensivas se perceberem que a pessoa se está a comportar de determinada forma porque tem uma demência, podendo até sugerir soluções para gerir o comportamento. Se não for confortável falar à frente da pessoa com demência sobre a situação – porque a pode deixar agitada ou agressiva – uma alternativa discreta de explicar aos outros será levar um cartão onde tem escrito que o comportamento é causado por uma doença do cérebro e mostrar quando for necessário; 
  • Avisar com antecedência familiares e amigos sobre os potenciais comportamentos da pessoa com demência, para que estes saibam o que esperar e tenham a oportunidade de se preparar melhor para lidar com a situação; 
  • Tentar permanecer calmo e utilizar o sentido de humor para ajudar a aligeirar qualquer estranheza ou desconforto que ocorra, seja em casa ou em locais públicos, servindo ao mesmo tempo para distrair a pessoa; 
  • Se a pessoa se estiver a despir, tente conduzi-la para um local mais privado e verifique se ela está com demasiado calor, desconfortável ou se precisa de usar a casa-de-banho; 
  • Adaptar a roupa. Escolher roupas que sejam difíceis para a pessoa despir sozinha, mas que não sejam demasiado restritivas (jardineiras, roupas com fechos ou botões nas costas) ou modificar as roupas já existentes, por exemplo, retirando o fecho éclair das calças; 
  • Se a pessoa se começar a masturbar em público e não a conseguir distrair ou demover, tente conduzi-la para um local mais privado onde esse comportamento não cause tanta perturbação. Se esse comportamento acontecer com frequência, proporcione atividades que a pessoa aprecia e que lhe ocupem as mãos, para evitar respostas impulsivas a estímulos do ambiente; 
  • Se lhe parecer que a pessoa está à procura de mais afeto físico ou intimidade, proporcionar-lhe contacto físico socialmente apropriado como dar as mãos, dançar, abraçar, massagens nas costas, manicures/pedicures, pentear ou arranjar o cabelo. Também se pode considerar recorrer a terapias com animais de estimação ou dando peluches. Muitas vezes, esses comportamentos acontecem porque a pessoa se sente ansiosa e necessita de ser reconfortada e tranquilizada através de afeto físico; 
  • Não tentar reprimir o comportamento da pessoa, verbal ou fisicamente, pois isso pode não só agravar ainda mais o comportamento, como conduzir a que a pessoa fique agressiva; 
  • Consultar o médico que acompanha a pessoa para: 
    • Perceber se os comportamentos desadequados estão associados a uma causa médica não diagnosticada, como por exemplo uma infeção urinária ou uma lesão cerebral que não a demência; 
    • Perceber se existe medicação que poderá trazer algum benefício, caso os comportamentos sejam persistentes ou coloquem a pessoa ou outros em risco, como por exemplo, condução agressiva ou descuidada devido à perda da noção do risco;
  • Obter apoio para o cuidador: 
    • Frequentar formações para cuidadores de pessoas com demência, para aumentar as competências, descobrir novas estratégias de lidar com estes comportamentos e encontrar outros cuidadores em situação semelhante, com quem partilhar sugestões e dificuldades; 
    • Contactar profissionais especializados em demência, como psicólogos, terapeutas ocupacionais ou enfermeiros, para aprender mais estratégias que possam funcionar na situação específica daquela pessoa com demência; 
    • Obter apoio médico, emocional, social e oportunidades de intervalos de prestação de cuidados, caso os comportamentos sejam frequentes e muito desgastantes (ver Descanso do Cuidador);
    • Os comportamentos desadequados e desinibidos podem ser bastante desgastantes para os cuidadores, em especial se envolverem comportamentos de natureza sexual ou de interações rudes ou ofensivas. Tirar algum tempo para partilhar os seus sentimentos e dificuldades com profissionais, familiares e amigos de confiança; 
    • Ponderar recorrer a apoio psicológico com um psicólogo.

Conteúdo atualizado a 30 de Novembro de 2022